Várias entidades internacionais alertam para uma tendência preocupante que está a ganhar força em diversos países europeus: o aumento da agressividade no trânsito. Com base em dados recentes divulgados pelo Conselho Alemão de Segurança Rodoviária (DVR), verifica-se um crescimento constante de comportamentos intimidatórios entre utilizadores da estrada — e Portugal não está imune a este fenómeno.
Segundo dados estatísticos das autoridades alemãs, só em 2024 foram registados mais de 37 mil casos de coação no trânsito, um aumento de 3,5% face ao ano anterior. Estes dados refletem um cenário que se observa também nas nossas estradas: buzinas abusivas, gestos agressivos, perseguições, bloqueios ou ultrapassagens perigosas tornaram-se atitudes frequentes — e perigosamente normalizadas.
E em Portugal? A realidade é preocupante
Apesar de se falar pouco sobre o tema, a realidade do tráfego português também reflete níveis elevados de agressividade entre condutores. Um estudo de 2017 realizado pela Continental Pneus Portugal, com base na Escala DBS – Driven Behavior Scale, revelou que:
- 27% dos condutores portugueses adotam comportamentos agressivos e hostis ao volante, sobretudo em situações de stress;
- Mais de 65% já demonstrou irritação para com outros condutores;
- 14% dizem palavrões frequentemente ou muito frequentemente enquanto conduzem;
- 35% gritam com outros condutores em momentos de tensão;
- 26% admitem fazer gestos ofensivos aos condutores que os enervam;
- Apenas 31,8% nunca buzinaram por zanga — ou seja, quase 70% já o fizeram, sendo que 30% o fazem com frequência.
Estes dados mostram que a agressividade não é um fenómeno isolado ou restrito a outras geografias. Pelo contrário: é uma realidade instalada também nas estradas portuguesas, com consequências diretas na sinistralidade, na saúde emocional dos condutores e na perceção de segurança por parte de todos os utentes da estrada, especialmente os utilizadores mais vulneráveis.
Porquê tanta agressividade no trânsito?
O trânsito é um reflexo da sociedade. E numa realidade cada vez mais marcada por stress, pressa e frustração, as estradas tornam-se palco de desabafos impulsivos e comportamentos pouco racionais.
Os principais fatores associados a esta agressividade incluem:
- Frustração com o trânsito intenso ou os congestionamentos;
- Tempo de espera prolongado nos semáforos;
- Sensação de falta de controlo ou sobrecarga emocional;
- Fenómeno psicológico da “externalização” — culpar os outros pelos nossos próprios erros ou atrasos.
Estas reações, ainda que emocionais, têm consequências reais e graves: colocam em risco a vida dos próprios condutores, de outros utentes da estrada— nomeadamente peões e ciclistas — e criam um ambiente de tensão e insegurança generalizada.
O que podemos fazer para reduzir a agressividade?
Para além da repressão, é essencial apostar na prevenção e na mudança de mentalidades. De acordo com uma sondagem recente realizada na Alemanha:
- 63% das pessoas defendem penas mais duras (multas, perda de pontos, suspensões) para comportamentos agressivos;
- 1 em cada 3 entrevistados sugere incluir um módulo sobre gestão de agressividade na formação de condutores;
- 32% destacam a importância da sensibilização através dos media e redes sociais.
A Prevenção Rodoviária Portuguesa defende que estes princípios devem ser aplicados também em Portugal, promovendo:
- Mais formação sobre empatia e respeito mútuo na condução;
- Integração de módulos comportamentais nos exames de condução;
- Campanhas públicas que valorizem o civismo e a tolerância na estrada;
- Apoio à educação rodoviária desde cedo, incluindo o papel dos pais como modelos de comportamento.
Todos se sentem vítimas… e também podem ser agressores
O aumento da intolerância no trânsito atinge todos os grupos:
- Condutores que se sentem bloqueados ou ultrapassados de forma imprudente;
- Ciclistas que enfrentam manobras perigosas ou desrespeito pelas ciclovias;
- Peões incomodados com trotinetes ou bicicletas nos passeios;
- Trabalhadores da via pública expostos a comportamentos de risco.
O tráfego urbano, cada vez mais complexo e dinâmico, intensifica este sentimento de conflito constante entre utilizadores da estrada.
Respeito por quem trabalha na estrada: um dever de todos
Há um grupo especialmente vulnerável e que muitas vezes sofre as consequências da impaciência dos condutores: os profissionais que trabalham na via pública. Desde operários da construção, equipas de recolha de resíduos, até aos serviços de emergência — todos eles desempenham funções essenciais, muitas vezes em condições de elevada exposição.
Quem trabalha na estrada não atrasa o trânsito. Mantém o país a funcionar. A segurança destes profissionais é um reflexo da nossa cultura
A mudança no trânsito começa na mudança de atitudes
A segurança rodoviária é uma responsabilidade partilhada que deve ser pautada pelo respeito das regras de trânsito e da adoção de comportamentos seguros que permitam uma convivência cívica e uma partilha harmoniosa do espaço rodoviário entre todos os utentes da estrada.
A PRP reforça o apelo: Menos agressividade. Mais respeito. Mais empatia.